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segunda-feira, 23 de dezembro de 2024

LIBERDADE SEM REGRA É CAOS... " DÁDIVA OU CAOS "!


 

Então vamos assim Capoeira!!!

Por Guilherme Arenghi e uma pequena alusão de Mestre Bicheiro.

             O Capoeirista livre

 

        Então vamos, o que esta  sendo dito.Você é livre para transitar, aprender, aprimorar viver todas situações que o leve ao seu objetivo dentro da Capoeira. Mas vamos enxergar  como esta ao nosso redor os fatos e   ações  dentro dela, a liberdade a qual a capoeira prega e te ensina  desde de seus primeiros passos atlético, como também filosóficos, de seus fundamentos e bases distintas, da qual ela carrega dentro de si e conseguiu traze-las de dentro do seu imo até as Eras de nossa atualidade contemporânea.         Mas vamos analisar o contexto, como diz um Amigo, Mestre Cinderelo..." Como vai a Capoeira? A capoeira vai muito bem obrigado , quem não esta bem é o capoeirista". 

       Então vamos refletir sobre esse assunto, por que todo problema vem da mesma maneira entre alguns pseudo capoeiras , e está se tornando mais frequente  e ativo dentro do meio. A liberdade que tanto falamos dentro dela e nos orgulhamos em te-las, hoje muitos a usam como forma de desvio moral, ético dos fundamentos da Capoeira, me desculpe aqui  a alusão comparativa a qual vou citar. Parecendo com as ações de advogados que conhecem tanto as leis, que enxergam e fazem o mau uso contra a própria lei para contornar e transgredir a própria base em bem próprio.     Saiba que o dito popular " Agua demais mata a planta" saber antigo usado para nos alertar sobre o mau causado. Neste ponto comparado com a Capoeira muitos praticantes de pouco gabarito  e sem paciência de viver os momentos certos,  "Aguardar o seu tempo". Fazem subterfúgios  para pular suas graduações, categorias, fases que seriam imprescindível para sua formação tanto acadêmica, qto Experimental. E atrás deles ficam buscando adeptos com sua mesma intenção e falta de caráter, não para nós claro e sim para a própria capoeira.  Ai nao valorizando sua merecida História de resistência, hierarquia,e fundamento. Passando assim a enganar com suas falsas promessas de glória. Entao  cuidado  liberdade de mais se torna Caos. Reflitam e vamos cuidar mais de nosso bem mais precioso e tentar passar lá para mais cem anos sem tanto danos a sua completude. 

Por Mestre Bicheiro


O CAPOEIRISTA LIVRE

Atire o primeiro dobrão quem nunca ouviu dizer que fulano de tal (percebo uma redundância aqui?!) é um capoeirista completo. Acho essa ideia de completude um tanto vaga e é exatamente sobre isso que falarei. Vem comigo? Como já sabemos, a capoeira é uma arte antropofágica, e assim sendo, sua formação provém de distintos e diversos folguedos populares da África e Brasil Africano. A priori de seu surgimento, temos como agregado a ela, o samba, a ritualística religiosa e as cantigas como forma de expressão.

      Com o tempo e o aumento de adeptos, a capoeira foi tomando novas formas e bebendo de outras águas, sendo usada como instrumento por inúmeros políticos e também pela força militar brasileira. Apesar de nova, se compararmos com as artes orientais, a capoeira passou de uma arte proibida por lei, para patrimônio cultural imaterial da humanidade, contudo, nesse trajeto foram criadas e recriadas situações que contradizem o verdadeiro sentido da capoeiragem, que aos meus olhos, sempre foi a liberdade.

Atualmente são tantos dogmas, regras, formações e informações que a ancestralidade se esvaziou daquilo que nunca poderia ser vazio, o fundamento. Parafraseando o amigo Tadeu, fundamento vem da nossa percepção mais profunda sobre determinado tema, nessa afirmativa, é perfeitamente cabível que cada mestre líder, tenha um entendimento sobre a ritualística, tradição e afins, resultando num processo de microfundamento, algo como o famoso fundamento da casa. Aliás, talvez essa expressão seja o cerne da problemática aqui apresentada, pois se cada casa possui o seu andamento, onde fica a liberdade do capoeira? 

Me lembro das histórias contadas pelos meus mestres, histórias de valentia, seja contra um adversário ou o sistema, mas que ainda assim, por incrível que pareça, essa valentia era contra nós mesmos. O padrão era o treino na academia, rotineiro, mas imprescindível para qualquer um que se preze. 

      A quebra do sistema provinha das visitas em outras academias e frequente participação em rodas de rua que, atrelado aos treinos rotineiros, moldavam cada capoeirista unicamente.  Sem dúvida alguma, toda visita acabava sendo vista como uma espécie de teste para os capoeiristas, onde alguns se testavam no jogo manhoso, outros nas acrobacias, um tanto também se inclinavam para a questão instrumental e, a grande maioria, na luta da capoeira. Isso era o normal da década de 1980-90 e início dos anos 2000, até que muitos mestres começaram a entender que a trocação na capoeira “limava” muitos alunos, gerando menos ganho financeiro. Nesse pensar, alguns mestres começaram a se fechar dentro do próprio grupo, onde só era “rezada a sua cartilha”, quiçá, quem aparecesse, teria que se moldar ao andamento da casa.

Ao passo que isso acontecia cada vez mais, a capoeiragem foi evoluindo sua questão teórico-acadêmica, ampliando o domínio investigativo da História da capoeira e, subjetivamente, criou-se inúmeras verdades para inúmeros grupos Brasil afora. Agora eu vos convido a refletir sobre o estereótipo do bom capoeirista, daquele ser, completo, que faz e acontece. Ele...existe?

Se existe eu não sei, mas sei que aqueles por quem temos uma afinidade maior, o enquadramos nesse âmbito de qualidade, e temo que por mais que eu queira estar errado, os “de fora” são ainda mais endeuzados dos daqui de casa, estranho, não? Como manter a essência de libertação que a capoeira carrega, se estamos acorrentados por um ego que, de certa forma, nos envaidece e nos tornam feitores um dos outros? Você joga a sua capoeira? Você é livre para se manifestar dentro daquilo que entende como capoeira, seja em jogo, musicalidade ou fundamento? Você joga para você ou para agradar alguém? Você tem a consciência de que está sendo livre na roda ou está ha tanto tempo amarrado que a corrente se manifesta numa pseudo-liberdade? 

O capoeirista é livre! Bom, é livre desde que não seja na minha casa. É livre sim! Desde que ele consiga arcar com as consequências, né, pois na roda, chora menos quem pode mais, estou certo? Nesse contexto, onde conseguiria apresentar a ideia de completude? Puxa vida, eu sou capoeirista! mas como assim, você não vira mortal? Eu sou capoeirista! 

       Mas como assim, você não toca atabaque? Eu sou capoeirista! Mas como assim, você não corre roda? Acredito que o capoeira ginga por um linha tênue, onde aplicar e conhecer são dissociáveis, ora, meu colega sabe tocar o atabaque e segura muito bem o ritmo, mas não tem nem ideia do porque está executando determinado toque ou o fundamento daquele andamento para a roda, já meu outro colega, não consegue tirar um bom som do atabaque mas pode facilmente dar uma aula sobre ritmos, fundamentos, tradições, inclusive para aquele excelente tocador. Agora, pergunto novamente, existe a completude dentro da liberdade? Hummm pergunta difícil, né?

Acredito que o inverso poderia comungar, ou seja, a liberdade dentro da completude, porém, essa completude ainda sim estaria dentro de cada casa, cada fundamento. Uma vez que eu apresento minhas limitações para a comunidade que me acolhe, sou livre para explorar as diversas formas de manifestar a cultura, seja na questão musical, intelectual ou ainda, no jogo. Você é completamente  livre para capoeirar para você ou ainda se prende no ego, na vaidade. Axé 

Por Cm.Guilherme Arenghi 



sábado, 14 de dezembro de 2024

Homenagem a Mestre Bimba




                      UM RÁPIDO OLHAR 

       O legado de Seu Bimba está presente em cada uma das rodas que são realizadas no mundo inteiro, cada vez que urma criança dá seus primeiros passos na capoeira, é Seu Bimba que está guiando as mãos do seu professor, até mesmo a capoeira Angola colheu frutos plantados pelo Mestre dos Mestres. 

    O que o Mestre Bimba realizou foi imenso, foi fantástico, fenomenal. Cada um dos Mestres do passado tiveram sua parcela de contribuição na história da capoeira,mas o Mestre Bimba se confunde com a própria história da arte de lutar com as pernas. Sua visão à frente de seu tempo, sua humildade em escutar seus alunos nas horas certas, a capacidade de untar conceitos e ideias aparentemente opostos fez dele um gigante, ou melhor O Gigante.

    Sempre que se fala em Capoeira, seu nome surge, sempre que reverenciamos o passado, sua aura aparece, toda vez que gingamos, nos inspiramos nele. Seu Bimba deixou de ser um homem e passou a ser uma entidade, uma instituição, um conceito, uma ideia.

        Sua trajetória começou a brilhar quando no início do século 20, mesmo com todas as barreiras sociais, ou seja, um homem iletrado, e mais, um homem negro iletrado naqueles tempos, resolveu encarar tudo e todos à sua volta, e não aceitou uma posição de subserviência, não aceitou a humilhação de pegar dinheiro com a boca para se sustentar , e tomou para si o seu destino, carregando consigo a revolução da capoeira.

        Num primeiro momento houve a gênese da mudança, ele idealizou, imaginou alem do que podia alcançar. Havia uma barreira, a capoeira tinha Seu lugar, mas era um lugar afastado,longe da riqueza, perto da invisibilidade. E quando falo em riqueza não é apenas material, é a riqueza subjetiva, é ser respeitado, andar de cabeça erguida encarando de frente os figurões, os médicos e advogados, é não ter que desviar o olhar e chamar qualquer branco de doutor. Foi Mestre Bimba quem teve êxito nessa batalha, não foi o primeiro a tentar, mas foi o primeiro capoeira a conseguir. 

     Reuniu seus companheiros capociras, mas infelizmente o preconceito e racismo sofrido por séculos estava incutido na mente deles e não aceitaram a caminhada, aliás, não acreditaram na mudança. E como um verdadeiro líder, tomou a tarefa de mostrar com seu próprio exemplo. Usou as ferramentas que estavam disponíveis para o branco e bateu de frente com os muros que separavam os lutadores de artes estrangeiras, vistos e reverenciados como Sportmen, dos negros capoeiristas, considerados vadios  e desordeiros. 

  Com a ideia de uma outra capoeira necessária, trabalhou. Em 1935 participou de um desafio com lutadores de Catch e Boxe, onde demonstrou sua Capoeira. Viu aí sua oportunidade de galgar mais um degrau, depois de conhecer por dentro esse tipo de estrutura, fez ele próprio seu desafio que serviu para mostrar para todos os capoeiras e para a sociedade que sua forma de ensinar era eficaz, tanto quanto quaisquer outras lutas. Foi campeão. Ganhou notoriedade, entrou no palácio e desfiou oficialmente. E nunca mais a Capoeira seria a mesma.

   O tempo passou, suas estratégias mudaram. O valor da capoeira no ringue já tinha sido provado, agota era hora de colher os frutos. Viagens e apresentações. Fez parte do programa oficial do governo sobre turismo, seu nome estava em várias revistas e jornais. Esteve com presidentes. No Rio, homens valorosos contribuíram com a capoeira, Sinhozinho. Zuma. Pederneiras, Mário Aleixo, Jayme entre tantos outros.  Mas o fundamento do Mestre Bimba é que vive até hoje, quando agachamos ao pé do berimbau pedimos sua benção e saímos de aú.

      lê viva Seu Bimba.

      Em 1899 nascia Manoel dos Reis Machado, o Mestre Bimba. Segundo Mestre Decânio declara na revista Cordão Branco, n 1, ele foi criado por sua irmā (Senhora), e que ela se mudou para o Rio de Janeiro quando ele tinha 09 anos de idade, deixando-o aos cuidados de Vidal de Xangô, seu padrinho de batismo. 

      Aos 12 anos iniciou sua vida na capoeira com o Mestre Nôzinho Bento, "Bentinho que era Capitāo da Cia.  de Navegaçāo Baiana, essa alcunha de capitão não se refere a uma patente das forças armadas, mas sim uma forma de reconhecimento e respeito à liderança de Mestre Bentinho no cais. 


REFERÊNCIAS ESCRITAS

DECANIO FILHO, Angelo A.. A herança de

Bimba: Filosofia el lógica africanas da capoeira. Salvador:edição do autor, 1996 (Coleçao São Salomão)

"Mestre Bimba: 0 Sonho de Salomão" 


      Bimba citava com admiração a extraordinária habilidade a meu ver espantosa do Mestre Bentinho! «di dá um sartu-mortá" na boca dun caxãu di cebola)

frisando a fragilidade do caixote "mutchu finu i fracu!" Mestre Tiburcinho afirmava que Besouro Mangagá era capaz di sartá di costa" i caí di vorta dentru dus chine-

lu!" O Mestre Noronha em seus manuscritos traz um possível apelido do Mestre Bentinho.

     Conheci muito o Bimba desde o comercio sendo operador de carretão ele e o finado Paquete que foi o mestre de capoeira dele na aquela época.

Fonte Mestre Bimba " O sonho de Salomão "
João Paulo de Araújo Pereira (João Pitoco)

sábado, 7 de dezembro de 2024

Atirei mas nao matei " Dj Capueira"


 

MINHA VIDA. "M. PERNALONGA"


 

MESTRE PELÉ DA BOMBA


 BIOGRAFIA DE MESTRE PELÉ DA BOMBA

        Paulo Andrade  Magalhães Filho Antonio Liberac Cardoso Simões Pires  Natalício Neves da Silva nasceu no povoado Cipuá, distrito de Governador Mangabeira, em pleno natal, dia 25 de dezembro de 1934, daí seu nome: Natalício. Sua infância, como conta, foi “trabalhando, arrancando mandioca, relando na prensa da casa de farinha”. Com a falta do pai e família grande, sendo o mais velho de doze irmãos, foi enviado para Salvador, com a idade de seis anos, para ser criado por outra família. Logo passou a trabalhar como carregador no Mercado Modelo. O antigo Mercado, que seria destruído pelo fogo em 1969, era o principal centro de abastecimento da Cidade da Bahia, um lugar dinâmico e de intensa circulação cultural, por onde chegavam, de saveiro, mercadorias de todo recôncavo baiano. 

Ali, a partir de 1940, o jovem Pelé tomaria intenso contato com a capoeira, o samba, a cultura do candomblé, pois ali são vendidos os itens necessários para (quase) qualquer trabalho. O interesse pela capoeira veio após ser vítima de bullyng pelos meninos da área: “Olha o tabaréu!”. Sua condição de interiorano era questionada, e ele logo aprenderia a sobreviver e a se defender naquele ambiente hostil, entre crianças que se criavam mais na rua do que em casa, que eram pejorativamente conhecidas como “capitães de areia”, expressão imortalizada pelo livro homônimo de Jorge Amado.

    Na década de 1940 existiam poucas academias de capoeira, e o aprendizado ainda se dava predominantemente por oitiva, observando e repetindo, de forma bem diferente das aulas regulares e sistematizadas realizadas hoje. Ali Pelé conheceu Mestre Bugalho, que trabalhava carregando mercadorias no embarque e desembarque dos saveiros na rampa do Mercado: Mestre Bugalho tinha um olho grande que nem vagalume e era o melhor tocador de berimbau que tinha, tirando Waldemar, que era o mestre dele. Quando ele tocava e o vento tava jogando pro lado de lá dava pra ouvir lá da ilha de Itaparica, em Mar Grande. (Mestre Pelé da Bomba, 2008) Embora haja poucos registros do Mestre Bugalho, é possível vê-lo tocando o berimbau gunga em uma filmagem,3 realizada pela antropóloga francesa Simone Dreyfus, em 1955. A gravação, realizada na areia de uma praia de Salvador, debaixo de coqueiros, registra uma roda conduzida pelo Mestre Waldemar da Paixão, com a presença dos mestres Caiçara, Zacarias Boa Morte, Traíra e Nagé, dentre outros. De acordo com o Mestre Pelé: Aconteciam rodas no cais e nas festas de largo; aqueles homens tudo vestido de branco, elegante [sic], pra jogar. 

    Tinha Waldemar, Zacarias, Traíra, Cobrinha Verde, Bel e Del, Avani, Domingo Mão de Onça, Creonte, Najé, Djalma da Ponteira, Bom Cabelo, Cabelo Bom, tudo homem perigoso [sic]. Alguns elementos culturais dessa época permanecem vivos na memória da capoeira atual. O uso da roupa branca; a elegância dos que vestiam sua melhor roupa para a festa, e jogavam capoeira sem se sujar; o jogo do “apanha a laranja no chão”, em que se disputava pegar com a boca um lenço com dinheiro no chão. Rodas em que havia muito respeito porque havia também muito perigo, e uma insolência ou provocação desmedida podia custar a vida, ceifada por uma navalhada fatal na garganta. Essa elegância se manifestava em dias especiais, como os domingos e dias festivos.  Nas ruas, Pelé enfrentaria a violência policial, que perseguia a prática da capoeira, uma manifestação que, se já não era mais proibida, continuava estigmatizada. Essas relações sempre foram ambíguas, porque as corporações militares constituem uma importante alternativa de trabalho para as classes populares.

     Um espaço de relativo poder e prestígio, com estabilidade profissional. O jovem Natalício teria no Exército a oportunidade de sair da rampa do Mercado Modelo e galgar outros espaços. Pelé tinha 24 anos quando foi tirar sua certidão de nascimento, mas como a idade padrão para entrar no Exército é 18 anos, teve que diminuir sua idade. O mestre havia entrado na vida adulta sem prestar nenhum esclarecimento ao Estado, sem nenhum tipo de documentação. Algo que soa estranho à nossa sociedade de controle atual, era comum há algumas décadas. A única face que ele conhecia do Estado até então era a repressão. Sua vida cotidiana não envolvia escola, políticas assistenciais, impostos, contas ou similares. Sua educação se deu nas ruas, festas de largo, espaços culturais informais. Mas a formação iniciada nas ruas passaria também pela rígida disciplina militar. Na 6.ª Região Quartel-General Companhia do QG, na Mouraria, faria a preparação física para os soldados do Tiro de Guerra. Depois de dar baixa no Exército foi morar no Alto do Saldanha, em Brotas. 

     Essa experiência de preparação corporal para os aspirantes marcou o futuro Mestre Pelé, conhecido pela metodologia exaustiva de treino. Sua caminhada o levou para o bairro do Retiro, onde foi magarefe, tratava e matava porcos. Ali conviveria com grandes mestres, como relata: “Caiçara também trabalhou no Retiro, ele matando boi e eu matando porco. Cobrinha Verde vendia facho lá no Retiro. Cassarangongo, Espinho Remoso, esse povo tudo era de lá”.  Mas a criação de uma academia em Brotas, quando existiam ainda poucas escolas de capoeira na cidade, veio a influenciar de forma significativa o campo. “Comecei a ensinar na rua, depois lá no Clube da Redenção, em 1959, 1960”. O Redenção Futebol Clube foi fundado em 1945, e sua sede, nessa época, ficava em frente ao cemitério, próximo à Ladeira da Cruz da Redenção. O Mestre conta que “de lá foi arranjando gente, de dentro do clube mesmo, eu dava aula àquele pessoal de movimento, ginástica, aquilo outro, como eu fazia no exército”. Por ali passaram diversos alunos que se tornaram grandes capoeiristas: Quem treinou lá foi Lua de Bobó, que foi meu contramestre, Raimundo Dias, Sapo, Vitor Careca, Paulo dos Anjos, Manuel, Alfredo, Eliseu, Junta de Ferro, mulher também, tinha Faquir, Manjar, Desordeira, ficava todo mundo lá em minha academia. Eu ensinava três vezes na semana e fazia a roda dia de domingo, lá mesmo no Clube da Redenção. 

Nessa época só quem que tinha academia era Pastinha, Bimba e eu. E o Waldemar que era caramanchão.[…] Sapo eu peguei com a idade de seis anos, eu ia buscar ele e o irmão lá embaixo, na Ladeira do Cacau, que a mãe dele deixava, e levava no Clube da Redenção. Aí́ depois que Canjiquinha levou ele pro Maranhão, ele malandro, era novo, ficou por lá mesmo. […] Vitor Careca lutava boxe, Paulo dos Anjos treinava com Vitor e passou a ser meu aluno. Na época era chamado Paulo Dedinho. Também passou por minha mão. (Mestre Pelé da Bomba, 2008) Aos poucos o trabalho foi se expandindo, agregando adultos e crianças, inclusive capoeiristas de outras academias, que lá frequentaram e treinaram. 

Alguns deles já faleceram, outros são grandes mestres. A importância do Mestre Pelé da Bomba para a transmissão e expansão da capoeira angola ainda não foi devidamente dimensionada na literatura acadêmica. Sua formação não se deu dentro de uma academia, mas pelos métodos antigos de transmissão de conhecimento, e seu reconhecimento como mestre pela comunidade foi anterior ao da maioria dos ícones vivos da capoeira baiana, hoje incensados como os grandes guardiões da tradição: “Eu fui ensinando pra’quele pessoal os movimentos e aí eu fui pra mestre. Lá pra 1960 começaram a me chamar mestre, mestre, mestre… e fui acreditado. Aí comecei a juntar o pessoal e sair pras festas de largo”. 

As festas de largo da Cidade da Bahia, oriundas em sua maioria do calendário católico, sempre foram atividades de rua e populares, marcadas pela cultura afrobrasileira, e ali o jovem Pelé conquistaria seu reconhecimento, organizando rodas de rua: Ah, tinham várias festas, vou dar o nome de todas. Primeiro começava por Santa Bárbara, dia 4, de Santa Bárbara a gente ia pra Conceição que é dia 8, dia 13 Santa Luzia, no dia primeiro Boa Viagem. Aí́ a Lavagem do Bonfim que era 15 de janeiro, da Lavagem que era quinta-feira aí́ ficava quinta, sexta, sábado, domingo. Da festa do Bonfim era Ribeira. Da Ribeira aí́ vinha Arembepe, vinha Boca do Rio, Rio Vermelho, a última festa era a de Iemanjá , já pra se encontrar com o carnaval. Ainda tinha festa de Santo Amaro, Maragogipe, Cachoeira, Cruz das Almas, Governador Mangabeira, Muritiba… mas aí́ você só ia quando tivesse condições, quando não tivesse não ia. Porque era muito longe, a gente ia uma vez ou outra, né! (Mestre Pelé da Bomba 2008) É dessa época, 1963/1964, uma foto clássica de Helinä Rautavaara em que Mestre Pelé, com calça vermelha, touca na cabeça e um cigarro displicentemente caído no canto da boca, coordena uma roda com seus alunos na Festa da Ribeira. estre Pelé conta que suas alunas eram pessoas simples, do bairro de Brotas e adjacências, e que participavam ativamente das atividades do grupo: “Eu saía com um bocado de mulher pras rodas, pras festas de largo. 

E as menina  que me acompanhava jogava capoeira, sambava, bebia, pintava a zorra!”. A partir da experiência das festas de largo, Mestre Pelé se aventura pelo recém-aberto filão de espetáculos folclóricos, o mercado que existia na capoeira da época, passando pelo grupo Viva Bahia, de Emília Biancardi, e pelo barracão do Belvedere da Sé, com o Mestre Canjiquinha, que morava no Cosme de Farias, também na região de Brotas: Eu fazia show aqui no Belvedere com Mestre Canjiquinha, Caiçara tinha um dia, depois passei a ter um dia com Dr. Tourinho. Fazia show no navio, fazia show no Belvedere, onde hoje é a Cruz Caí́da. D. Augusta fazia apresentação com candomblé e samba de roda. Ela tinha um candomblé em Periperi, quando acabava o show dia de sábado ia pra lá bater um candomblé. (Mestre Pelé da Bomba, 2008) Em 1966, Mestre Pelé fez a prova e ingressou no Corpo de Bombeiros, onde permaneceu por mais de uma década. Daí é que vem seu apelido “da Bomba”. Depois mudaria de corporação, passando para a Polícia Militar. 

Nos dois locais ele ensinaria capoeira: “Eu dei aula quinze anos no Corpo de Bombeiro e dez anos na Polícia Militar. Saí do bombeiro e entrei na polícia. Eu fazia show e ensinava no Corpo de Bombeiros do Retiro; no Passeio Público, onde tem o QG; e na Vila Militar, nos Dendezeiros”. Pelo quartel do Retiro passaram dois alunos que deixariam seus nomes marcados na história da capoeira: os mestres Dimola e Índio, que fizeram fama no Mercado Modelo. “Dimola foi pra lá e levou Índio. Eles foram meus alunos, não foram de fulano nem de bertrano, não”. Depois de alguns anos, com a chegada da idade, o acúmulo de atribuições e responsabilidades, Mestre Pelé termina por fechar as academias e se afastar dos espetáculos folclóricos. Após a aposentadoria, abre um bar em seu condomínio, no Cabula. Depois monta uma tenda de produtos de capoeira no Terreiro de Jesus, até integrar a Associação Brasileira de Capoeira Angola e se tornar seu presidente: Teve uma época que eu me aborreci; não quis mais… que eu tava cansado; andava muito pelo mundo afora. Aí́ deixei Sapo, Vitor Careca, Eliseu… 

Essa raça toda deixei na mão de Canjiquinha. Ele sabia que os menino era bom. Aí́ pegou os menino [sic] e ficou lá fazendo show. (Mestre Pelé da Bomba, 2008) Dentre os vários alunos do Mestre Pelé que seguiram seus rumos, vale a pena destacar Sapo,5 que teria um papel de fundamental importância na capoeira do Maranhão; Mestre Dimola,6 até hoje cantado e celebrado nas rodas de rua; e Mestre Índio,7  ainda vivo, forte e atuante. Mestre Pelé é o atual presidente da Associação Brasileira de Capoeira Angola (ABCA), desde 2012, em sua terceira gestão. A ABCA (que teve sua primeira fundação, não registrada, em 1987) foi criada em 1993 para reunir a velha guarda da capoeira tradicional baiana, trazendo de volta mestres antigos que estavam afastados da prática. Em 1996 é criado o seu Conselho de Mestres, e desde então o Mestre integra os quadros da associação, assumindo, em 2008, a gestão da loja da entidade, onde comercializa instrumentos, roupas, livros, CDs e DVDs de capoeira. À frente da Associação, o mestre tem zelado pela conservação do espaço, um casarão tombado no centro histórico de Salvador, e realizado diversos projetos, como os workshops de capoeira angola da ABCA, que reúnem anualmente mais de trinta mestres em vivências, palestras e debates, e o Circuito Periférico de Capoeira Angola, que conecta os trabalhos sociais desenvolvidos em diversas comunidades de Salvador. 

Em 2017 organizou um livro com 43 biografias de mestres, contramestres e parceiros da ABCA, em três idiomas, além de um CD mesclando cantigas antigas e autorais de mestres e contramestres da associação. 

Mestre Pelé, também conhecido como o Gogó de Ouro da Bahia, gravou CD´s de capoeira angola, samba de roda e samba de viola; lançou um CD na França, A Paixão do Tempo Velho, foi tema de um episódio da série O Bom Jeitinho Brasileiro (Canal Futura, 2007), do documentário A Paixão e o Capadócio (2008) e do livro O Pelé da Capoeira (2010). Continua ensinando capoeira na sede da ABCA e coordenando as rodas que acontecem tradicionalmente às sextas-feiras. 

Referências Bibliográficas 

MAGALHÃES FILHO, Paulo Andrade. Tudo que a boca come: a capoeira e suas gingas na modernidade. 2019. 222f. Tese (Doutorado) – Programa Multidisciplinar de Pós-Graduação em Cultura e Sociedade, Instituto de Humanidades, Artes e Ciências Professor Milton Santos, Universidade Federal da Bahia, 2019. SCALDAFERRI, Sante Braga Dias. Natalício Neves da Silva: O Pelé da Capoeira. Salvador: Vento Leste, 2010. A PAIXÃO e o Capadócio – Mestre Pelé Gogó de Ouro. Augusto Januário; Santa Rosa, 2008.