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quinta-feira, 29 de janeiro de 2015

NAVIO NEGREIRO






Navio negreiro (também conhecido como "navio tumbeiro") é o nome dado aos navios de carga para o transporte de escravos, especialmente os escravos africanos, até o século XIX.

Aprisionados no interior da África subsaariana, por outros africanos que lucravam com o tráfico, os escravos eram trazidos em marcha forçada até o litoral do continente, onde os sobreviventes, que não haviam sido comercializados localmente, eram despojados de suas roupas e eventuais pequenos pertences que ainda carregassem consigo, para serem vendidos aos comerciantes europeus, que os embarcavam nos navios negreiros. Neles, os escravos eram destinados aos porões da embarcação, onde ficavam presos em grupos às correntes. Cada navio, levava em média quatrocentos africanos amontoados. O mau-cheiro imperava, e o espaço para movimentação era mínimo, porque embora navios deste tipo fossem geralmente grandes, se otimizava o espaço do mesmo para caber o maior numero possível de escravo.
                     
A partir de 1432 quando o navegador português GIL EANES levou para Portugal a primeira carga de escravos negros vindos da África que os portugueses começaram a traficar os escravos com as Ilhas das Madeiras e em Porto-Santo. Mais adiante os negros foram trazidos para o Brasil.
A história dos navios negreiros é das mais comoventes. Homens, mulheres e crianças eram transportados amontoados em compartimentos minúsculos dos navios, escuros e sem nenhum cuidado com a higiene. Conviviam no mesmo local, a fome, a sede, as doenças, a sujeira, os agonizantes e os mortos. Em média transportava-se 400 negros em cada compartimento desses.

Sem a menor preocupação com a condição dos negros, os responsáveis pelos navios negreiros amontoavam negros acorrentados como animais em seus porões que muitas vezes advinham de diferentes lugares do continente africano, causando o encontro de várias etnias e que por vezes eram também inimigas. Seus corpos eram marcados pelas correntes que os limitavam nos movimentos, as fezes e a urina eram feitas no mesmo local onde permaneciam. Os movimentos das caravelas faziam com que muitos passassem mal e vomitassem no mesmo local. Os alimentos simplesmente eram jogados nos compartimentos uma ou duas vezes por dia, cabendo aos próprios negros promover a divisa da alimentação. Como os integrantes do navio não tinham o hábito de entrar no porão, os mortos permaneciam ao lado dos vivos por muito tempo.

               Quando o navio encontrava alguma dificuldade durante seu trajeto, o comandante da embarcação ordenava que os negros moribundos ou mortos fossem lançados ao mar, como alternativa para reduzir o peso do navio. Nestes casos, o mar acabava se tornando a única saída dos negros para a luz, antes de chegarem aos destinatários do comércio.



A organização da Companhia dos Lagos propunha-se a incentivar e desenvolver o comércio africano e dar expansão ao tráfico negreiro, sua viagem inicial motivou a formação de várias companhias negreiras, tais como:

COMPANHIA DE CACHEU,
COMPANHIA DE CABO VERDE e COMPANHIA DE CACHEU DE NEGÓCIOS PRETOS (1675)

 COMPANHIA REAL DE GUINÉ e COMPANHIA DAS ÍNDIAS (1690)

 COMPANHIA DAS ÍNDIAS OCIDENTAIS(1636).

                
                               

No Brasil, devido ao êxito do empreendimento, deu-se a criação da Companhia Geral de Comércio do Brasil(1649).

Somente no século XIX que as leis proibiram o comércio de negros. Entre 1806 e 1807, a Inglaterra acabou com o tráfico negreiro em seu Império e em 1833 proibiu o trabalho escravo. No Brasil, mesmo após o tráfico negreiro ter sido proibido, a escravidão permaneceu até 1888.

O tráfico transatlântico de escravos africanos começou a entrar em decadência, somente a partir da sua abolição no início do século XIX peloReino Unido, com alguns países como oBrasil persistindo em sua prática, até serem forçados a abandoná-lo décadas depois. Devido às péssimas condições, físicas e psicológicas, em que se encontravam os escravos transportados, muitos morriam, eram mortos ou suicidavam-se durante a travessia.


Fonte:
Rediker marcus


POSTADO POR MESTRE BICHEIRO

segunda-feira, 26 de janeiro de 2015

•Estudo Sobre Toques de Berimbau


Francisco Ferreira Filho Diniz
Professor de Educação Física


O berimbau é um instrumento que foi adotado pelos capoeiristas como o principal regente da orquestra da capoeira. Antigamente o atabaque era quem ditava o ritmo. 
Estamos pesquisando os toques abaixo relacionados procurando associá-los ao jogo correspondente conforme descrição de Mestres, através de literaturas aqui citadas, (ver bibliografia) bem como através de entrevistas. 
ANGOLA- Toque lento e cadenciado. Serve para jogo rente ao chão, lento e malicioso (Revista Praticando Capoeira, ano I, n.º 03).
BANGUELA- Jogo de dentro com faca - segundo Carybé em citação de Nestor Capoeira no livro: Os fundamentos da Malícia, ed. Record, pág. 119.
SÃO BENTO PEQUENO - Também chamado de "ANGOLA INVERTIDA" - Toque para um jogo amistoso, muito técnico (Revista Praticando Capoeira, ano I, n.º 04). 
SÃO BENTO GRANDE DE ANGOLA -
SANTA MARIA -
APANHA LARANJA NO CHÃO TICO-TICO - toque para o jogo de apresentação em que os capoeiristas apanham dinheiro no chão com a boca (Revista Praticando Capoeira, ano I - n º 02, pág. 07).
AVISO - Toque para denunciar a presença do senhor de engenho, capitão do mato ou capataz (Revista Praticando Capoeira, ano I - n º. 02, pág. 07). Segundo dizem os capoeiristas mais antigos, servia para avisar aos escravos da presença do feitor ou capitão-do-mato (Mestre Bola Sete, em: Capoeira Angola na Bahia, pág. 66, ed. Pallas, RJ, 1997).
CAVALARIA - toque que imita o trotar do cavalo, avisando que há polícia nas proximidades. Esse toque foi criado por volta de 1920 para avisar a chegada da cavalaria de "Pedrito", um temido delegado de polícia que perseguia os capoeiristas (Revista Praticando Capoeira, ano I - n º 02, pág. 07). Antigamente servia para avisar aos capoeiristas, da presença da Cavalaria da Guarda Nacional (Mestre Bola Sete, em: Capoeira Angola na Bahia, pág. 66, ed. Pallas, RJ, 1997).
Capoeira Regional
Os toques de Regional inicialmente eram acompanhados por uma bateria inconstante que se apresentava de acordo com a decisão do Mestre Bimba, podendo conter um, dois ou três berimbaus. Tempos depois por sugestão de Decânio, a charanga resumiu-se a um berimbau e dois pandeiros. 
AMAZONAS - criação de Bimba, era dificílimo de acompanhar tal a riqueza de ritmos, a sutileza das variações melódicas; poucos capoeiristas conseguiam obedecer aos seus comandos, mais raros ainda os que conseguiam executá-lo no berimbau. 
Amazonas é um toque festivo para saudar mestres e visitantes. É chamado de hino da capoeira (Revista Praticando Capoeira, ano I, n.º 05).
BANGUELINHA - Jogo de dentro, colado, corpo a corpo, treinamento para defesa de arma branca.
BANGUELA - Jogo de dentro, colado, corpo a corpo, treinamento para defesa de arma branca.
Benguela - Toque para jogo compassado, curtido, malicioso e floreado (Revista Praticando Capoeira, ano I, n.º 05).
CAVALARIA - Jogo duro, pesado, violento. 
IDALINA - jogo alto, solto, manhoso, rico em movimentos.

Idalina - Apresentação de jogo com facas, facões, porretes (Revista Universo Capoeira, ano I, n.º 03, agosto/99).
Idalina - Toque para jogo de navalha (Revista Praticando Capoeira, ano I, n.º 03).
IÚNA -Jogo baixo, manhoso, sagaz, ardiloso, coreográfico, exibicionista; retorno ao estado lúdico. 
Iúna - Só para formados e mestres com movimentos de balões (Revista Universo Capoeira, ano n.º 03, agosto/99).
SANTA MARIA - Toque simples, porém rápido; permite jogo solto e alto aceitando bastante floreio. 
Santa Maria - Jogo com navalhas (Revista Universo Capoeira, ano n.º 03, agosto/99). 
SÃO BENTO GRANDE DE REGIONAL - Jogo ao estilo regional: forte, rápido, mais para violência que para exibicionismo; viril sem perder a malícia. 
SÃO BENTO PEQUENO DE REGIONAL - São Bento Grande às avessas; um jogo mais suave, corpo a corpo, aceitando mais deslocamentos e malícia. 
NOTA: As explicações feitas aqui, dos toques que estão SUBLINHADOS e em ITÁLICO, referentes a Capoeira Regional foram retiradas do livro de Ângelo Decânio:

A Herança de Mestre Bimba, págs. 183 e 184.
Outros Toques de Berimbau
Angola em Gegê - 
Angola Santo Malandreu - Criação de Silvio Acarajé, uma ladainha, uma preparação para o início do jogo de capoeira (Revista Praticando Capoeira, ano I, n.º 06). 
Angolinha -
Assalva - 
Ave-maria - Toque com início lento, demonstrando equilíbrio e conhecimento da arte (Revista Praticando Capoeira, ano I, n.º 08).
Barravento - Toque rápido, bonito e agradável de se ouvir, em que o solista demonstra os infindáveis recursos de repique que há no berimbau. O jogo é solto, muito à vontade; é uma demonstração de alegria (Revista Praticando Capoeira, ano I, n.º 08). É apropriado para o desenvolvimento do jogo em ritmo acelerado (Mestre Bola Sete, em: Capoeira Angola na Bahia, pág. 65, ed. Pallas, RJ, 1997).
Toque Capoeirarte –

Capoeirarte - Criação do Prof. Francisco em 27/09/1998 para exposição individual, no início ou final da roda. 
Dandara - Criação de Silvio Acarajé em homenagem às mulheres que praticam capoeira. Dandara, de acordo com os registros de Palmares, foi o grande amor de Zumbi, o rei do Quilombo dos Palmares (Revista Praticando Capoeira, ano I, n.º 06). 
Estandarte - 
Gegy - É um toque vigoroso. O jogo da capoeira é em angola, a diferença está no toque do berimbau, no repique, onde predomina a influência do Gegy-Nagô (Revista Praticando Capoeira, ano I, n.º 06). 
Ijexá - 
Jeje (Gegê) - 
Jeje-ketu - 
Maculelê - 
Muzenza - Toque originário do candomblé, criado pelo Mestre Canjiquinha. Na capoeira demonstra-se desprezo pelo adversário (Revista Praticando Capoeira, ano I, n.º 08). 
Samango (homem preguiçoso) - Criação de Canjiquinha. É lutado de lado, tem a presença de poucos movimentos. Sua característica de manifestação é a chapa giratória, a chapa de lado,rasteira e vôo do morcego (Revista Praticando Capoeira, ano I, n.º 04). 
Samba de Angola - é usado quando se dança o samba de roda ou o samba duro (Mestre Bola Sete, em: Capoeira Angola na Bahia, pág. 66, ed. Pallas, RJ, 1997).
Samba de roda - 
Samba duro –

São Bento Grande Gegê
Sete de Ouro - 
Signo-Salomão (Cinco Salomão) - utilizado para denunciar a presença de estranhos na roda de capoeira (Mestre Bola Sete, em: Capoeira Angola na Bahia, pág. 66, ed. Pallas, RJ, 1997).
Comentários 
Na realização dos toques de berimbau destinados à capoeira é interessante lembrar que não há consenso entre mestres e grupos. Em parte, isso é bom pois mostra a complexidade e sua riqueza, exigindo do capoeirista disposição para o estudo e aprofundamento sobre o assunto. Nestor Capoeira cita, no seu excelente livro "Fundamentos da Malícia, ed. Record", uma preleção de Mestre Morais em 1984 onde alguns toques são apresentados de forma diferente. Os toques de São Bento Pequeno e São Bento Grande por exemplo, são tocados de uma forma que eu, particularmente, desconhecia.
Mestre Bola Sete dá uma explicação diferente (da que eu conheço) sobre os toques de Santa Maria, Amazonas, Idalina, Benguela, e Yuna. Em seu livro Capoeira Angola na Bahia, ed Pallas, pág. 68, ele comenta: "O toque de São Bento inverte o toque de Angola; o toque de Santa Maria inverte o toque de Benguela e o toque de Amazonas (jogo de dentro) inverte o toque de Idalina (jogo de fora). O toque de Yuna deve ser executado apenas pelo berimbau viola". 
Longe aqui de querermos determinar o que é certo e o que é errado. Queremos mesmo é refletir sobre a maneira de cada mestre ou grupo executar determinados toques e concluir que esta maneira peculiar de cada um precisa ser preservada. Assim diríamos: o toque de Santa Maria da linhagem de Caiçara é... ou, Santa Maria executado na linhagem de Morais é... o toque de benguela segundo Bimba é... cavalaria ensinado por Mestre Nô é ... 
Aparentemente temos a impressão de uma grande confusão, mas na verdade isso mostra o quanto é difícil estudar a capoeira sem dar aos seus conteúdos um caráter conclusivo, especialmente o seu lado musical. 

POSTADO POR MESTRE BICHEIRO

sexta-feira, 23 de janeiro de 2015

Ciríaco x A República



Breves considerações acerca da vida de um capoeira na virada do século XIX/XX

Marco Castilho Felício


Ciríaco Francisco da Silva, vulgo Macaco, talvez seja um nome conhecido entre os praticantes mais interessados na arte-luta. Natural de Campos (RJ), sujeito elegante – sempre acompanhado de sua bengala, ou “Santo Antônio 16”, como ele preferia chamá-la – entre grande parte dos cariocas de hoje, ele não passa de um anônimo (pesquisando no Google Maps, não é sequer nome de rua). Entretanto, nem sempre foi assim. Não que os dias tenham sido melhores. Aliás, pelo contrário. Mas por ironia do destino e por contradições peculiares de nossa história, quis o tempo que um negro pobre nascido em 1872, capoeira e morador dos cortiços do Rio de Janeiro tivesse seus dias de glória justamente num momento em que todas as suas qualidades, características e condições concretas de vida fossem, sob o ponto de vista do poder instituído, algo indesejável. Ciríaco era exatamente o que a nascente República queria extirpar da sociedade.
No dia 15 de maio de 1909, a revista O Malho publicou uma reportagem sobre o acontecimento que transformou Ciríaco numa celebridade: a luta do capoeirista contra o japonês Sado Miako, expoente do jiu-jitsu que ministrava ensinamentos da luta para a Marinha do Brasil, ocorrida no Pavilhão Internacional Paschoal Segreto. Nas palavras do próprio Ciríaco, eis o desenrolar da contenda: ”Cheguei em frente com ele, dei as minha cuntinença e fiz a primeira ginga, carculei a artura do negrinho, a meiada das perna, risquei com a mão p’ra espantá tico-tico, o camarada tremeu, eu disse: então? Como é? Ou tu leva o 41 dobrado ou tu está ruim comigo, pruque eu imbolá, não imbolo. O japonês tremeu, risquei ele por baixo, dei o passo da limpeza gerá, o negrinho aturduou, mexeu, mas não caiu”. Durante a luta, Ciríaco percebeu as reações do público ao seu favor e continua no relato: “Eu me queimei e já sabe: tampei premero, distroci a esquerda, virei a pantana, óia o hóme levando com o rabo-de-arraia pela chocolateira. Deu o ar comprimido e foi cumê poeira. Aí eu fiz o manejo da cumprimentação e convidei o hóme p’ro relógio de repetição, mas o gringo se acontentou com a chamada e se deu por sastifeito”. O êxito na luta resultou em “dezoito mil réis” jogados pela platéia, entrevistas a jornais e demonstrações para estudantes do Rio de Janeiro.
Mas é necessário que o acontecimento seja analisado em seu contexto. Durante quase todo o século XIX, os debates parlamentares sobre o que fazer com a enorme massa de escravos, caso a escravidão acabasse, e em como fazer do Brasil um país racialmente branco, livre da presença negra, foram constantes no parlamento. O pensamento de Tavares Bastos, jurista e político atuante na segunda metade do século XIX, reflete bem isso. Defendia ele, sobre o estímulo à imigração européia, que: “O homem livre, o homem branco, além de ser muito mais intelligente que o negro, que o africano boçal, tem o incentivo do salário que percebe, do proveito que tira do serviço, da fortuna que enfim pode accumular a bem da sua família. Há entre esses dous extremos, pois, um abysmo que separa o homem do bruto [...] Cada africano que se introduz no Brazil, além de afugentar o emigrante europeu, era em vez de obreiro do futuro, o instrumento cego, o embaraço, o elemento de regresso das nossas indústrias”.
Na virada do século, discursos racistas que defendiam o branqueamento da população – o tal “racismo científico” – ainda encontravam forte repercussão entre as elites e o meio acadêmico. Oliveira Vianna, outro jurista e defensor da eugenia, referência nas primeiras décadas do século XX, acreditava que: “A miscigenação roubou o elemento negro de sua importância numérica, diluindo-o na população branca. Aqui o mulato, a começar da segunda geração, quer ser branco, e o homem branco (com rara exceção), acolhe-o, estima-o e aceita-o no seu meio. Como nos asseguram os etnólogos, e como pode ser confirmado à primeira vista, a mistura de raças é facilitada pela prevalência do ‘elemento superior’. Por isso mesmo, mas cedo ou mais tarde, ela vai eliminar a raça negra daqui”.
Na mesma onda, a cidade do Rio de Janeiro, desde os anos de 1880, sofria profundas transformações urbanísticas, orientadas por idéias higienistas, cujos principais propósitos eram a modificação/eliminação das áreas onde se encontravam as chamadas “casas de habitação” (casarões velhos que tinham seus quartos alugados para diferentes famílias) e principalmente os malfadados cortiços, maciçamente habitados por escravos e capoeiras. Não somente o espaço urbano, mas várias manifestações negras foram sistematicamente perseguidas pela ordem. Nesse momento, a capoeira, considerada pelo estudioso Luiz Sérgio Dias como “prática negra organizada”, é criminalizada e enquadrada no Código Penal de 1890. De maneira geral, a “turba” carioca está sob inconveniente assédio por parte do Estado – vide aí a Revolta da Vacina.


Cortiço no Rio de Janeiro da virada do século XIX-XX

Voltemos ao nosso camarada Ciríaco. Havia, de um lado, uma estrutura político-ideológica francamente racista, e de outro, uma cidade que, se na época das maltas era a “cidade-esconderijo” dos capoeiras e escravos, oferecendo sempre vias de fuga e espaços de socialização (como os cortiços), no período da contenda do ilustre personagem, ela apresentava-se como “cidade-inimiga”.
Surge então um paradoxo: apesar da ordem vigente, perseguidora dos capoeiras, existe também uma grande receptividade (ainda que problematizável, inclusive do ponto de vista das relações raciais) popular, mostrada na própria luta de Ciríaco e Sado Miako. Os jornais apresentavam discursos exaltando a capoeira, sobre sua importância como a “luta brasileira”, revelando indícios sobre manifestações de nacionalidade, fortemente exploradas anos mais tarde no governo de Getúlio Vargas (também sobre isso, ler O Jogo da Capoeira: corpo e cultura popular no Brasil, de Luiz Renato Vieira). A própria manifestação de apreço por parte da platéia durante e após o embate, de certa forma, demonstra isso, assim como a notícia de falecimento de Ciríaco veiculada até em Porto Alegre, em 21 de maio de 1912 (vitimado pela uremia). A capoeira tornava-se então a benção e maldição do Brasil, e em particular, do Rio de Janeiro.
Como nos lembra Jair Moura, Ciríaco e seu rabo-de-arraia certeiro colaboraram muito para a reafirmação da capoeiragem, desarticulada pela repressão no Rio de Janeiro desde as últimas décadas do século XIX. Se Mestre Bimba e Mestre Pastinha foram representantes que reivindicavam a importância da capoeira como grande manifestação cultural brasileira frente ao poder institucional e a setores da intelectualidade, Ciríaco é uma espécie de titã negro; é a cara de uma capoeira cujo único poder era seu enorme apelo popular.
http://estudoscapoeira.blogspot.com.br/2011/08/ciriaco-x-republica.html?m=1



Referências:


CHALHOUB, Sidney. Visões da liberdade: uma história das últimas décadas da escravidão na corte. São Paulo: Companhia das Letras, 1990.

MOURA, Jair. A Capoeiragem no Rio de Janeiro através dos Séculos. Salvador: JM Gráfica e Editora LTDA, 2009.

SILVA, Eduardo. Dom Obá II d’África, o príncipe do povo: vida, tempo e pensamnto de um homem de cor. São Paulo : Cia. das Letras, 1997.

THEODORO, Mário. (Org.). As políticas públicas e a desigualdade racial no Brasil 120 anos após a abolição. Brasília : Ipea, 2008.

VIEIRA, Luiz Renato. O jogo da capoeira: corpo e cultura popular no Brasil. Rio de Janeiro: Sprint, 1998.
MESTRE LUIZ RENATO
POSTADO PÓR MESTRE BICHEIRO