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segunda-feira, 4 de março de 2019

A PRESENÇA DA MULHER, NA ROTINA DA CAPOEIRAGEM DAS RUAS, NA BAHIA SEGUNDA METADE DO SEC. XIX e XX NA BAHIA.

                



INTRODUÇÃO
Esse não é um assunto muito estudado E pouco sabemos sobre as primeiras mulheres nas rodas de capoeira, segue a baixo um resumo de algumas mulheres que possivelmente foram capoeiristas na Bahia. A pesquisa está relacionada mais ao estado da Bahia, pois há 5 anos busco algo mais concreto sobre o tema em questão, e a Bahia foi o lugar com maiores números de registros. Em dados momentos, alguns registros, sobre outras mulheres de outros estados surgiram, e os mesmos foram agregados ao texto. Dentre as fontes de pesquisa deste trabalho, está a tese do professor mestre em História Josivaldo Pires de Oliveira. (Pelas ruas da Bahia). Dissertação de Mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação em História, da Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Federal da Bahia, sob a orientação da Profª Drª Lina Maria Brandão de Aras, para a obtenção do grau de Mestre em
História Social.

UMA OBSERVAÇÃO IMPORTANTE

Uma coisa é a mulher na roda de capoeira, outra coisa é a mulher na capoeira, ou no meio da capoeira. Estamos falando de um período, onde a roda de capoeira era um ambiente masculino. Porém, o código penal enquadrava por crime de capoeiragem, qualquer pessoa que causasse tumulto em público. Capoeira no código penal, não contava só o ato de destreza corporal, qualquer um que causasse tumulto público, era preso por capoeiragem, independente de ser capoeirista ou não. Muitas das mulheres citadas aqui nesse texto, podem sim terem sido capoeiristas, mas o fato de terem sido presas por capoeiragem não nos dá a garantia de dizer que as mesmas foram praticantes.

QUEM ERAM ESSAS MULHERES?

A capoeiragem fazia parte do universo das ruas. As zonas portuárias eram o ponto de encontro de estivadores, pescadores, trapicheiros, carroceiros, feirantes e toda uma massa de trabalhadores das ruas. Os botecos, a prostituição, a bebedeira e as constantes contendas, estavam sempre nas manchetes dos principais jornais. As mulheres de meretrício, a disputa por territórios, por pontos de prostituição levavam muitas das mulheres da noite a fazerem das zonas portuárias, verdadeiros campos de batalhas, inúmeras foram as prisões de mulheres da noite, acusadas de desordem e capoeiragem. Em pequena escala também temos outros públicos femininos como; lavadeiras, donas de casa, vendedoras ambulantes e etc.

ROSA MARIA DOS SANTOS

A doceira Rosa de Oliveira apaixonou-se pelo engraxate Vitorino Pereira dos Santos, que tem caixa em frente ao elevador, na praça Rio Branco. Há tempos Rosa, que é ciumenta, azedosse com o engraxate e prometeu esbordoal- o. Ante-hontem a doceira encontrou o antigo apaixonado e em plena praça Rio Branco, deu-lhe de chinello. A arruaceira usando as peripécias da capoeiragem começou a agredir a vítima em plena luz do dia. O Sr. 3o Delegado Auxiliar que passava no momento effectuou a prisão a mulherzinha, entragando-a aos guardas civis 295 e 135 que a conduziram para o posto policial da Sé.
Créditos;
Jornal de Notícias, 23/08/1917

ADELAIDE PRESEPEIRA

Uma desordeira que durante as comemorações do 2 de Julho promovia arruaças sempre com uma navalha em punho. Entre as décadas de 20 e 30
Créditos;
ALBUQUERQUE, Wlamyra R. de. Algazarra nas ruas...

ANGÉLICA ENDIABRADA

Uma desordeira que marcou época entre 1910 e 1920, Ana angelica(angelica enduabrada) estava sempre aparecendo nas manchetes dos jornais e registros policiais como uma valentona da Bahia.
Endiabrada" era o adjetivo dado uma mulher com destreza na luta corporal. Angélica recebeu esse apelido após enfrentar o guarda civil 67 e resistir a prisão, chegando a bater no guarda,quebrando a boca do sujeito.
Créditos;
VIANNA, Antônio. Casos e coisas da Bahia... Op. cit., p. 91.
Jornal O Dia 02/10/1918

MARIA IZABEL

presa em 1914 “por está promovendo desordem com uma navalha em punho pelas ruas de salvador”
28/02/1914, p. 7.
98 Gazeta do Povo, 02/12/1914,

ZEFERINA x IDALINA MARIA DE JESUS

Foi presa mais uma vez Zeferina de tal, por brigar com sua companheira Idalina Maria do Sacramento, “encontraram-se as desafectas e foram ao duello a murro e pontapé”.

Nesse episódio o jornal de notícias relata um conflito entre duas mulheres. Porém o que mais me chamou atenção foi a palavra companheira, poderiam as duas serem companheiras de profissão, no caso meretrizes, poderiam ser amigas... Não se sabe ao certo mas o jornal aponta uma certo relacionamento diário entre ambas(boa alma).
Jornal de Notícias, 09/08/1917(BA)

REGINA DOS SANTOS

Hontem, às 7 horas da noite, na ladeira da Praça, Estevam Durvalino dos Santos e Regina Gomes de Carvalho travaram-se razões e entraram em lucta.
Regina, munida de uma navalha, cortou seu adversário, que arrepeliu a murros.
O guarda civil, que estava de serviço na Independência, sendo avisado, dirigiu-se ao local e prendenduo-os.
Créditos;
Jornal de Notícias de 10 de fevereiro de 1914

Nessa caso podemos usar duas hipóteses para entender essa briga, poderia Regina ser a esposa de Durvalino, e se tratar de uma briga de casal, ou ser a mesma uma meretriz e esse o seu cliente. Porém o que mais chama a atenção é o fato da mesma está portando e manejando uma navalha, arma típica dos capoeiristas nesse período. Um forte indício da mesma ser uma capoeirista(boa alma).

ALMERINDA MENINIHA e CHICA

Três mulheres de pá virada, que habitam a Baixa dos Sapateiros, bateram, hontem, pela manhã com os costados no xadrez do posto policial da Lapinha, a ordem do respectivo subdelegado em virtude de terem passado uma tremenda descompostura na família de um cidadão ali. Este procurou a autoridade policial e narrou os abusos das atrevidas raparigas, pelo que foram ellas parar ao xilindró destrito 101.
Créditos;
(1917, p. 2. 101 Jornal de Notícias, 24/04/1920, p. 2.)

Neste depoimento, as três mulheres que possivelmente seriam prostitutas, foram presas e o homem,"possivelmente casado", teve a sua identidade preservada, pois seria um escândalo para a época.(boa alma)

ANTONIA DE TAL(catitú ou catú)

Mulher Perigosa, Antonia de tal muito conhecida por Cattú, residente na rua do Polytheama, é uma mulher de cabellinho na venta. Já por diversas vezes tem sido chamada á policia e não comparece.
Hontem, as 3hs. De tarde, “azedou-sse” e desandou forte descompostura em uma outra. O civil n. 119, que reside nas inmediações, fez ver o seu procedimento incorrecto sendo aggredido. Cattú, avançando para o guarda arrancou-lhe os botões da túnica, rompe-lhe a camisa, que ficou em tiras. Travou-se forte lucta.
O guarda pediu socorro, comparecendo os praças de ns.64, 4, 14, 203, um musico do regimento policial, 2 praças e 1 sargento, e a perigosa mulher luctou com todos, sendo a muito custo conduzida á secretaria. Na lucta alguns guardas sahiram feridos, inclusive o 119, que tomou uma dentada na mão e desmentiu um dedo.
Créditos;
Jornal de Notícias de 10 de fevereiro de 1914,.

Devemos investir na possibilidade de cattú, ter sido de fato capoeirista, pois a fonte nos permite enxergar uma grande destreza corporal, afinal estamos falando de uma mulher sozinha, lutando com quatro policiais.(boa alma)

MRIA MOURA, MARIA GOMES, ODELINA DE TAL, ESTETHER E CÁRMEN

Outro caso foi relacionado ao quarteto formado por Maria Moura, Maria Gomes, Odelina de tal, Esther e Cármen, que foram presas por crime de desordem em 22 de julho de 1927, no distrito da Sé, região onde se situava grande parte das zonas de prostituição da Cidade descrito 115, Infelizmente o documento não é muito rico em descrição, dificultando algumas informações que nos permitiria argumentar melhor sobre o comportamento dessas mulheres.
Elas não ficaram pouco tempo na Casa de Correção ou foram presas várias vezes. Em 24 de janeiro de 1929, no distrito da Sé, foi registrada a soltura de Esther Souza da Silva. Carmem Barbosa foi solta em 12 de maio de 1930, no distrito da Conceição da Praia. Temos aí algumas hipóteses. Estas poderiam não ser as mesmas Esther e Carmem, presas juntas em Julho de 1927, no distrito da Sé, em companhia de três outras mulheres. Mas também poderiam ser as mesmas, sendo que se trata de outras prisões principalmente no caso de Carmem uma vez que o documento encontrado indica o distrito da Conceição da Praia e não a Sé.
As zonas indicadas na documentação como de prostituição eram também reincidentes nos casos de desordens e outras formas de contravenção, como conflitos que produziam em suas vítimas lesões corporais e, às vezes, até homicídio. Portanto, as casas de prostituição eram ambientes instigadores desses conflitos por várias razões, desde as mais fúteis como bebedeiras, até as mais qualificadas como a disputa de poder nas zonas.
Muitas mulheres eram proprietárias das casas e não escapariam às prisões quando das batidas policiais nas zonas.
Créditos;
(Estado da Bahia, 29/08/1935.).

MARIA DE LOURDES,

Maria de Lourdes da qual encontramos duas Portarias de Soltura. Uma datada de 24 de janeiro de 1931 e outra de 17 de julho do mesmo ano, todas na Conceição da Praia.
Cabe aqui considerar que nas zonas não só havia casas de prostituição, mas também residenciais.

CHICÃO

Outro caso emblemático ocorrido no dia 29/08/1935, foi a briga entre Francisca Albino do Santos(chicão), e o valente Pedro Porreta, após a briga o jornais noticiaram o valente Porreta muito machucado na delegacia. Houve um segundo encontro e uma nova contenda, porém foi no terceiro encontro que o destino de porreta foi traçado. No dia 10/09/1937, um ponta pé certeiro de Chicão derrubou o valente que bateu a cabeça numa guia de calçada vindo a falecer no local.
Créditos;
Jornal o dia 10/09/1935
O correio da Bahia 10/09/1935.
Jornal o dia

SALOMÉ A UNICA QUE SE TEM NOTICIA QUE EBTRAVA NA RODA DE CAPIEIRA

Mestre Atenilo, um dos alunos mais antigos do mestre bimba, nos dá a seguinte informação; Salomé era uma valentona das décadas de 20 e 30. " Ela(Salomé), Cantava a no samba e jogava capoeira,você encostava ela passava a rasteira e te botava de pernas pro ar. Entrava no Batuque e lhe derrubava duas três vezes. E era valente!
Créditos;
ALMEIDA, Raimundo César Alves de. Mestre “Atenilo”: o relâmpago da capoeira regional. (depoimentos). Salvador: Núcleo de Recursos Didáticos da UFBA, 1988. 76 Idem, p. 50. 77 Idem.

Mestre Curió em sua biografia, também nos informa, que a sua mãe, Maria Santos(Maria pequena Malvadeza), era uma exímia capoeirista. Porém o mesmo não fala se a mesma entrava na roda de capoeira(boa alma).

MULHERES CITADAS PELOS MESTRES ANTIGOS COMO CAPOEIRISTAS QUE AINDA CARECEM DE FONTES SEGURAS

Nega Didi, Maria para o bonde e Maria cabaço. Entre os anos 30 e 40. Maria pé no mato, entre os anos 20 e 30. Doze Homens, Maria Felipa de oliveira(heroína da independência). Com exceção dessa última, a existência das outras ainda é uma incógnita. Maria Felipa foi uma grande heroína da Bahia e do Brasil, porém se foi capoeirista, ainda não podemos cravar.

MULHERES CITADAS EM CANTIGAS MAS QUE NUNCA JOGARAM CAPOEIRA

Maria do Camboatá

D. Maria do Camboatá vendia espetinhos próximo a uma usina na atual região de Camaçari entre os anos 30 e 40. Os funcionários da usina compravam e brincavam dizendo que não iriam pagar. D. Maria já e idosa é a maioria das vezes sob efeito do álcool, pegava pai, pedra, facão, faca... Etc. Para ataca los. Os capoeiristas que geralmente faziam rodas por perto, vendo as inusitadas cenas de D. Maria, faziam trovas e improvisos nascendo assim o famoso corrido.
Créditos;
J.Bamberg; Mestre Angoleiro; discípulo dos Mestres Pastinha e Bimba. Depoimentos cedidos a ele por seu Caetano irmão de D. Maria. Os quais o mestre meu amigo pessoal, gentilmente me passou.

OUTRAS MULHERES DE OUTRO ESTADOS

“Até o belo sexo, quando empenham qualquer luta mostram ser
peritas em capoeiragem”.
Nesse relato o jornal anuncia a prisão de algumas mulheres que brigavam nas ruas do Rio de Janeiro, na segunda metade do séc. XIX. Lembrando que desde 1809 que D. João já havia decretado leis contra Capoeiristas, tanto é que muito antes do código penal de 1890, já havia capoeiristas presos na ilha das cobras no RJ.
Creditos;
Jornal a Constituição 21/08/1876

Nesse mesmo periodo. Em 19/10/1976 o jornal O perió-dico informava da prisão de Jerônima, escrava de Caetano Antônio de Lemos, autuada por transgressão da ordem pública na prática de capoeiragem. Outras notícias sobre mulheres capoeiras em Belém
apresentavam atos de violência em que elas utilizavam navalhas, facas
e cacetes.
Créditos;
SOARES, C. E. L. A negregrada instituição, 1999. p. 303.Ibid.
LEAL, Luiz Augusto Pinheiro; PANTOJA, Letícia Souto. Das bulhas e vozerias: a
presença de mulheres na capoeira, em Belém do Pará no final do século XIX. In: Alva-res, Maria Luzia Miranda; SANTOS, Eunice Ferreira (Org.). Desafios de identidade:
espaço-tempo de mulher. Belém: Cejup, 1997. p. 69.
21 LEAL, L. A. P.; PANTOJA, L. S. Das bulhas e vozerias: a presença de mulheres na capoeira,
em Belém do Pará no final do século XIX. 1997. p. 79-81.

O DR. PROF. HISTORIADOR JÉFFERSON BACELAR OUTRA FONTE DE PESQUISA PARA COMPLEMENTO DESTE TEXTO

O estudo de Jéferson Bacelar sobre a prostituição em Salvador na década de 1970 identifica a rua 28 de Setembro ainda como uma localidade de tráfico de drogas e casas de prostituição. BACELAR, Jéferson. A família da prostituta. São Paulo: Ática, 1982.

109 APEB: Portarias de Recolhimento e Soltura, Departamento de Polícia Preventiva, Penitenciária, Secretaria de Segurança Pública, Seção Republicana, cx. 43, pac. 3.. 110 Alguns capoeiras a exemplo de Pedro Mineiro e Pedro Porreta, são identificados pela documentação como Cafetões nas zonas de prostituição. Em Belém do Pará muitas das mulheres capoeiras eram identificadas como vagabundas e prostitutas, situação semelhante ocorreu na Cidade do Salvador no período estudado.

CONCLUSÃO:

O título do texto deixa claro que a proposta foi apontar a presença das mulheres no universo da capoeiragem. Algumas situações no texto nos mostram um caminho para seguirmos crendo que, muitas dessas mulheres poderiam sim de fato terem sido capoeiras, haviam também a presença de mulheres brancas nas noites pelas ruas da Bahia, porém a predominância era negra. Em breve farei um texto falando sobre as mulheres que de fato foram capoeiristas, nas décadas correspondentes aos anos de 50 e 60 pra cá nas academias dos Mestres; Pastinha, Gato Preto, Emídio e alguns outros.

Texto:
Antônio Luiz dos Santos Campos(boa alma)









domingo, 3 de março de 2019

"Subsídio para o Estudo da Metodologia do Treinamento da Capoeiragem".




Por Inezil Penna Marinho
 Segundo o historiador Carlos Eugênio Líbano Soares, que examinou o registro de prisões de escravos do século XIX, os anos entre a chegada da família real, em 1808, e a abdicação do primeiro imperador, em 1831, foram marcados pelo "terror da capoeira" no Rio de Janeiro. A Bahia não ficava atrás. Salvador era um barril de pólvora, os negros fizeram mais de trinta revoluções nesse período.
Antigos capoeiras figuram em fatos memoráveis. Mais também, diversos atos oficiais procuram acabar com as desordens das lutas de capoeira. Uma portaria de 16 de março de 1826 do intendente geral de polícia do Rio de Janeiro mandou que fossem presos e imediatamente punidos com 100 açoites os escravos encontrados jogando a capoeira. 
Capoeiras baianos lutaram pela nossa independência, na boa terra de todos os santos. 
No Rio de Janeiro em junho de 1828, capoeiras prestaram grande ajuda para dominar os batalhões de mercenários alemães e irlandeses que, revoltados, colocaram a população em pânico.
A câmara municipal de São Paulo, atendendo a uma representação do presidente da província, Coronel de Milícias Rafael Tobias de Aguiar, aprovou, em 24 de Janeiro de 1833, uma postura mandando que qualquer pessoa que praticasse a capoeira em lugar público, sendo livre seria presa por três dias e pagaria multa de um a três mil réis, sendo cativa seria presa por vinte e quatro horas com a pena de 25 a 50 açoites.
O quadro de Johan Moritz Rugendas intitulado "jogar capoeira ou danse de la guerre", de 1835, é considerado o primeiro registro preciso sobre a capoeira. Neste quadro dois negros se situam em posição de luta enquanto um outro, sentado, toca um atabaque que segura com as pernas. Outros negros, homens e mulheres, assistem à luta (ou jogo) que se realiza.
Em 10 de julho de 1843 faleceu no Rio o Marechal Miguel Nunes Vidigal, capoeira exímio e que apareceu, como o Major Vidigal, no livro "memórias de um sargento de milícias", um dos clássicos da nossa literatura.
Ao longo do século dezenove a capoeira torna-se uma nítida expressão da situação vivida pelo negro no Brasil. 
As mudanças ocorridas na economia e na política do império vinham gerando um intenso processo de desescravização. Lembremo-nos de que a Lei Eusébio de Queirós, de 1850, já havia proibido o tráfico negreiro para o Brasil. A lógica do sistema econômico mundial e brasileiro impunha a substituição do negro pelo trabalhador imigrante e isso gerava uma inevitável situação de marginalidade. A capoeira floresceu dessa forma, e são inúmeros os relatos de jornais do século passado que narram as aventuras dos capoeiras (esse nome, até meados deste século, era utilizado para designar o lutador; a luta era denominada capoeiragem).
Naquela época, a capoeira reunia não só ex-escravos e seus filhos, mas também figuras importantes da sociedade. Aos poucos a capoeira foi se envolvendo com a vida política e chegou a ser amplamente utilizada como arma na luta entre as facções que se enfrentavam nos tempos do império e nos primórdios da república, sobretudo nas cidades do Rio de Janeiro, Salvador, Recife e São Paulo. Os capoeiras eram contratados para interferir em comícios, tumultuar eleições e fazer a segurança de figurões da política.
Em 1864 na Bahia, grupos de capoeiras foram desorganizados por causa da convocação para a guerra do Paraguai, que tiveram uma participação ativa lutando contra os mercenários (soldados estrangeiros contratados para guerra), que se rebelaram e foram rechaçados pelos capoeiras. E após a abolição de 1888, como sabemos, o fim do regime escravocrata não significou a aceitação imediata da comunidade negra na vida social. 
Ao contrário, vários aspectos da cultura afro-brasileira sofreram violenta repressão, como a capoeira no Rio de Janeiro em todo o Brasil e principalmente no nordeste. Talvez o caso da capoeira seja o mais evidente: essa forma de rebeldia, que já havia sido utilizada como arma de luta em inúmeras fugas durante a escravidão, tornou-se um símbolo da resistência do negro à dominação. Assim, o Governo Republicano, instaurado em 1889, deu continuidade a essa política e associou diretamente a capoeira à criminalidade, como consta do decreto 847 de 11 de outubro de 1890, com o título "Dos Vadios e Capoeiras":
ARTIGO 402 - Fazer nas ruas ou praças públicas exercícios de destreza corporal conhecidos pela denominação de capoeiragem: pena de dois a seis meses de reclusão. 
PARÁGRAFO ÚNICO - É considerada circunstancia agravante pertencer o capoeira a alguma banda ou malta. 
Aos chefes, ou cabeças, impor-se-á a pena em dobro. Na capital paulista, março de 1892, alguns "morcegos" (praças de uma polícia fardada da época ) maltrataram soldados do exército recentemente recrutados. 
Doendo-se pelos companheiros, soldados capoeiras promoveram violentos distúrbios na cidade. Por ocasião da revolta da armada, setembro de 1893, lutaram entre si grupos de praças capoeiras do exército e da marinha. Em 1907, surge a primeira tentativa de instituição de uma "ginástica brasileira" com o título "O Guia da Capoeira" cujo autor, um oficial do exército que julgou prudente não revelar o nome pelos preconceitos então existentes - ocultou-se sob as iniciais O.D.C. Em 1908 toda capoeiragem vibrou com a vitória do "Moleque Círiaco" sobre o Conde Koma, oficial superior da marinha de guerra do Japão e campeão de jiu-jitsu considerado invencível. Ciriaco, com um violentíssimo rabo-de-arraia na cabeça do campeão nipônico, lançou-o por cima de duas fileiras de cadeiras, desacordando e com forte hemorragia nasal. Anos mais tarde, um marinheiro do encouraçado São Paulo, ancorado no porto de Nova York, envolveu-se em briga de rua e derrubou, um por um, oito vigorosos policias conseguindo fugir para bordo do seu navio, onde declarou não ter necessitado fazer uso da sardinha ( navalha ) para o golpe decisivo do corta-jaca ( navalha na barriga ). 
A luta brasileira, portanto, começou a ser tratada como esporte nacional e surgiram os primeiros estudos sobre sua utilização como método de defesa pessoal e ginástica. Em 1928, Annibal Burlamaqui pública "Gymnastica Nacional" (Capoeiragem ) Methodizada e Regrada, e em 1945, Inezil Pena Marinho, especialista em educação Física, pública "Subsídio para o Estudo da Metodologia do Treinamento da Capoeiragem".